BRASÍLIA. Além de vencer uma prova acirrada de
conhecimentos e suar a camisa nos testes físicos, candidatos a diversas
carreiras no Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal precisam
atender a requisitos no mínimo controversos. A menos que tenham um
atestado de virgindade, mulheres devem apresentar exame de papanicolau.
Tatuagens em área extensa do corpo também são vetadas a todos os
aspirantes à carreira pública.
Não só as marcas feitas de forma
voluntária na pele estão proibidas, mas também cicatrizes cirúrgicas
extensas no abdômen ou tórax ou aquelas deixadas por operações
ortopédicas recentes nos membros, independentemente do tamanho. As
regras, que constam em seis editais de concurso do órgão para contratar
profissionais variados, de soldados a médicos e engenheiros, reacenderam
a discussão sobre o limite das exigências presentes nas seleções
públicas.
No caso dos exames exigidos das candidatas que passarem da fase dos
testes físicos, os editais usam termos técnicos. O procedimento
conhecido popularmente como papanicolau está descrito como
“colpocitopatologia oncótica”. Ainda segundo o edital, só está
dispensada do papanicolau, a “candidata que possuir hímen íntegro” e
“desde que apresente atestado médico que comprove a referida condição”
Especialista em direito aplicado aos concursos públicos, o advogado
Rudi Cassel classifica a exigência do papanicolau ou atestado de
virgindade como um requisito abusivo, que, além de violar a privacidade
da candidata, colocando-a em situação vexatória, é pouco eficaz para os
anseios da Administração Pública.
- A única razão para pedir exames prévios é para verificar se a
pessoa tem condições de desempenhar o cargo. Não é razoável pedir um
papanicolau para verificar se a candidata tem uma neoplasia maligna
(câncer). E se ela tiver, isso significa que está incapacitada? ---
questiona Cassel.
Para o advogado, considerar cicatrizes de cirurgias torácicas,
abdominais e nos membros como condições de inabilitação para o cargo soa
até mais absurdo que a exigência do papanicolau ou atestado de
virgindade. Cassel afirma que não há nenhuma explicação que justifique a
presença de itens como esses num edital de concurso público,
independentemente do cargo:
-- O princípio geral do concurso público é o amplo acesso, para
verificar os mais aptos. Então, essas restrições devem ser previstas,
mas com reserva e bom senso. Pedir uma infinidade de exames, além de dar
um trabalhão para o candidato, pode ser sinal de cláusulas abusivas.
Em nota, o Corpo de Bombeiros Militar do DF afirmou que os testes de
papanicolau são necessários para verificar a capacidade de desempenhar
as funções e serão entregues em envelope lacrado, preservando o sigilo.
“Entendemos que a exigência do exame complementar citado não viola o
sigilo das candidatas, tampouco desrespeita o direito à intimidade, à
honra e à imagem. Pelo contrário, retrata o cuidado e o zelo que a
Corporação possui com os futuros militares, tudo em conformidade com a
lei”, diz a corporação.
Questionado sobre a presença de cicatrizes entre causas de
inabilitação, e de tatuagens extensas dentro das condições
incapacitantes previstas nos editais dos concursos, o Corpo de Bombeiros
Militar do DF não respondeu.
Proibição de tatuagem está no STF
A polêmica envolvendo a proibição de tatuagens para candidatos a
cargos públicos é antiga e já chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF)
em forma de recurso. A Corte declarou repercussão geral para o caso,
para que a decisão seja válida em todo os julgados semelhantes no país.
Ainda não há data para que o Supremo analise.
O processo hoje no Supremo começou quando um candidato ao cargo de
soldado da Polícia Militar de São Paulo acionou a Justiça porque foi
declassificada em razão de uma tatuagem na perna. Ele obteve sucesso em
primeira instância, mas o Tribunal de Justiça paulista reformou a
decisão. O candidato, então, entrou com recurso, que chegou à mais alta
Corte do país.
No caso do Corpo de Bombeiros do DF, estão proibidas tatuagens que
“apresentem símbolos, imagens e/ou inscrições alusivos a ideologias
contrárias às instituições democráticas, ou que preguem a violência e a
criminalidade; discriminação ou preconceitos de raça, credo, sexo ou
origem; ideias ou atos libidinosos; apologia ao consumo de drogas”. Além
disso, marcas que simplesmente estejam em “área extensa do corpo”
também são motivo para desclassificação do candidato, porque, segundo os
editais, podem prejudicar “os padrões de apresentação pessoal” adotados
pela corporação.Fonte PH